21-06-2011

Responsabilidade Compartilhada

Victor Bicca
Presidente do CEMPRE

Há muitos anos em Brasília, o gaúcho Victor Bicca Neto concedeu esta entrevista no espaçoso escritório da Coca-Cola localizado no Lago Sul, com vista para o Lago Paranoá. Sorridente, o executivo de uma das mais valiosas marcas do mundo, entre um gole e outro de uma lata de Matte Leão, demonstra seu envolvimento com as questões de sustentabilidade; “hábitos e atitudes precisam ser mudados”, comenta.

Bicca divide sua vida profissional como diretor da Coca-Cola e presidente do Cempre, uma associação sem fins lucrativos dedicada à promoção da reciclagem e mantida por mais de 30 empresas privadas, “São quase 20 anos de existência do Cempre, desde a Rio 92, pensando na reciclagem”, contou.

Ele afirma que o objetivo principal da PNRS é acabar com os lixões no Brasil. Segundo dados do Cempre, 92% dos mais de cinco mil municípios brasileiros ainda não possuem sistema de coleta seletiva, sendo que 60 mil toneladas de lixo são despejadas diariamente em aterros sanitários sem qualquer tipo de seleção. Apenas 13% do lixo produzido no Brasil é reciclado e a meta do Cempre é ajudar a elevar esse índice para 40% no prazo de 20 anos (56% consistiria em lixo orgânico não-reciclável), esclarece Bicca.

O executivo conta que o Brasil já é exemplo de reciclagem e que não é preciso copiar modelo de nenhum outro país, “Cada país tem sua realidade, nós somos nossa própria realidade. Temos que construir a nossa forma de fazer”, advertiu.

O Cempre trabalha para engajar o setor privado, criar responsabilidades e reforçar iniciativas de modelos que já existem. Faz isso através de um comitê que estimula a inclusão dos catadores e dá apoio às cooperativas para melhorar o sistema de coleta seletiva. Citando dados do Ministério do Meio Ambiente, Bicca ressalta que em Belo Horizonte 40% dos resíduos produzidos na capital mineira não seriam recolhidos se não fosse pelo trabalho dos catadores. Ele cita ainda outro exemplo a ser seguido – o do setor de latas. “No Brasil o setor recicla 98% de seus produtos”, informa o executivo. “Esse modelo de logística reversa é fantástico”.

Victor Bicca apresenta outras novidades importantes trazidas pela nova lei dos resíduos sólidos. “Eu diria que o maior avanço está na criação do conceito de responsabilidade compartilhada, na qual toda a cadeia é responsável pelo ciclo de vida dos produtos – fabricantes, importadores, distribuidores e comerciantes, consumidores e poder público”.

A PNRS trata de questões igualmente relevantes, como, por exemplo, a obrigatoriedade da logística reversa e o estímulo da inclusão das cooperativas e associações de catadores em todo o processo. O presidente do Cempre reitera a importância e analisa que isso só será possível se todos os envolvidos estiverem efetivamente engajados. “A população vai ter que se educar”, pontua. “Devemos começar desde a escola. Governo Federal e o setor privado deverão fazer sua parte. São desafios que todos devem enfrentar juntos”, ressalta o executivo.

Apesar dos avanços, Victor Bicca aponta que a lei ainda pode ser aprimorada. Segundo ele, existem questões tributárias a serem discutidas, como, por exemplo, a desoneração de materiais reciclados que, em muitos casos, são mais caros que os não-reciclados por serem duplamente taxados. “Precisamos de um tratado político para mudar essa realidade”, alerta.

O Brasil terá dois grandes desafios nos próximos anos: a Copa do Mundo e as Olimpíadas. Segundo Bicca, os olhos do mundo estarão voltados para o País, e o Brasil precisa estar preparando para esse grande desafio. “Todas as cidades sedes precisarão se adaptar e mostrar que fazem pelo nosso país e pelo nosso meio ambiente. Temos que ser exemplo na reciclagem”, concluiu.

>> Notícias da Lata - Edição 37

Mais notícias dessa publicação: