15-08-2009

O futuro será quente

Fernando Paulo Nagle Gabeira, deputado federal (PV/RJ), jornalista e escritor

Fernando Paulo Nagle Gabeira,
deputado federal (PV/RJ), jornalista e
escritor

E agora? Os dados sobre o aquecimento global são irrefutáveis. O que fazer? Os governos começaram a se movimentar, dando a impressão de que podem tratar do problema sozinhos.

No entanto, sem a sociedade não vão muito longe. É preciso que cada um dê sua cooperação na vida cotidiana. Todos os conselhos sobre o tema vêm do Norte. O próprio documentário de Al Goore menciona alguns pontos que orientam a atuação individual no combate ao aquecimento.

A maioria das sugestões de Gore e dos outros que escrevem por lá destinam-se a habitantes de países que usam o petróleo como energia. Quase todas, portanto, orientam para economizar energia.

O Brasil precisa, também, economizar energia. Nossa matriz energética é relativamente limpa. Tiramos mais de 90 por cento do nosso consumo de energia dos recursos hídricos nacionais. As sugestões para combater o aquecimento terão mais eficácia se as adaptarmos às condições brasileiras.

O Brasil é o quarto país do mundo no ranking dos que aquecem o planeta. Nossas emissões de dióxido de carbono estão divididas assim: três quartos a partir do desmatamento e queimadas e o quarto restante como resultado de atividades industriais e domésticas.

Portanto, no caso brasileiro, plantar árvores é bom caminho. Todas as empresas que pensam em neutralizar suas emissões usam, de alguma forma, este meio. A neutralização significa capturar a mesma quantidade de carbono que se emite.

Outro aspecto que está ao nosso alcance é regular periodicamente as emissões do próprio carro. No Brasil, ainda não temos uma lei de inspeção veicular nacional. Esta lei serviria para baixar as emissões, pois obrigaria a reparar os motores desajustados. Há um projeto na Câmara, há pelo menos cinco anos, que não consegue andar. A razão é que estados e municípios disputam o dinheiro que seria arrecadado nesse processo.

Esta paralisia não impediu que a cidade de São Paulo tomasse a iniciativa. Por que não fazer o mesmo em todas as cidades em que isto for possível? Claro, sempre haverá alguém questionando uma decisão municipal sem respaldo em lei federal. Mas o próprio debate que, eventualmente, o tema suscitar, pode ser um impulso para que a lei seja aprovada.

Independentemente da lei, o ajuste do próprio carro está ao alcance do dono. O Brasil avançou para os carros flex, o que significa menos poluição, pois o álcool reduz em torno de 70 por cento a emissão de CO2. Ainda assim, os ajustes contribuem.

Também nas cidades, sobretudo nos lixões e aterros sanitários, há uma grande produção de metano, um gás de efeito estufa muito mais poderoso que o CO2. O primeiro projeto do chamado Mecanismo do Desenvolvimento Limpo no mundo foi aprovado em Nova Iguaçu e diz respeito ao aproveitamento do metano. Os financiadores foram holandeses.

Por que não conduzir todas as prefeituras que podemos influenciar no caminho do aproveitamento do metano?

Outro tópico importante é o da adaptação. Precisamos iniciar um diálogo com a arquitetura, discutir materiais de construção e, principalmente, traçar uma política defensiva para o avanço do mar. Como se sabe, o IPCC prevê uma elevação de até 0,59 centímetros no nível dos mares.

Quem vive em Pernambuco e conhece a Praia de Boa Viagem, as cidades de Jaboatão e Paulista pode ter uma idéia do que significa o avanço do mar. Produzi textos sobre o assunto e há um relatório analisando as conseqüências em todo o Brasil.

No campo da economia energética também existem ações que ajudam. Apresentei um projeto exigindo que os aparelhos eletrodomésticos não consumam mais do que 1 watt, quando em stand by. Isto significa um período de adaptação da indústria, mas é uma adaptação inevitável.

Existe uma condição, na qual a participação individual é decisiva: a do consumidor. Nesta condição é possível fazer um exame de todos os produtos que nos chegam e, progressivamente, ir afastando aqueles que contribuem para o aquecimento. Algumas empresas automobilísticas já estão prontas para lançar um carro neutro; isto é, produzido de forma a não aumentar as emissões.

A partir de agora, cada indivíduo vai ser confrontado com as ofertas amigáveis ao meio ambiente e que surgem como fruto da própria concorrência.

O modo de produção e o consumo passam a ser relacionados com o impacto ambiental. O resultado é uma vigilância redobrada sobre os poluidores e um estímulo crescente à produção limpa. Na Inglaterra, por exemplo, uma rede de supermercados hoje informa a quantidade de emissão de carbono ocorrida na elaboração de cada um dos produtos que comercializa, da mesma forma que as embalagens de alimentos detalham corriqueiramente a quantidade de calorias.

Mesmo o álcool, que está sendo colocado como uma saída para reduzir emissões, passa a ser examinado com muita atenção no seu processo produtivo. Se, por exemplo, forem descobertas queimadas no processo de produção, os próprios consumidores internacionais vão rejeitá-lo.

Dentro em breve o Brasil terá inventário anual de suas emissões. E, também está no horizonte a definição de metas nacionais para reduzí-las. Por que não colocar metas individuais da redução de emissões?

Do carro à plantação de árvores, da economia de papel à poupança energética, vale tudo para garantir a continuidade do planeta e honrar um compromisso ético com as novas gerações, passando pela escolha da embalagem.